Após uma morte solitária e monótona, sem nenhum inimigo
russo, alemão ou japonês, morte de velhice mesmo, o Capitão América se
encontrou em frente a um espelho de bronze com adornos dourados num estilo
barroco. No vidro, viu um rosto que não era seu. Era o rosto de um cidadão
comum, daqueles que em vida ele tanto lutara para proteger, mas sempre de
longe, já que era especial demais para se misturar ao povão.
Passando
a mão em seu novo rosto, tentando se acostumar com a idéia de que aquela face
no espelho era sua e entender o que estava acontecendo, sentiu que alguém o encarava.
Virou de costas e reparou que lá haviam vários homens com a mesma face que ele,
tentando entender que lugar era aquele com espelhos que pareciam ter caído do
céu, mesmo que lá não houvesse céu.
Alguns
daqueles homens estavam sentados no chão, formando uma grande roda de faces
idênticas encarando umas as outras (inclusive a que encarara nosso protagonista)
e alguns ainda estavam de pé se olhando no espelho, admirando suas novas caras.
Porém, o mais estranho do lugar era a forma como as pessoas se encaravam. O
próprio soldado olhava os outros e pensava: “esse tem cara de
comunista”, mas afinal de contas, para um dependente químico que atravessara
uma crise de abstinência de dois meses numa cama de hospital, qualquer um
poderia parecer um porco comunista.
Com o
tempo, mais pessoas foram aderindo à roda até que não sobrou ninguém de pé. Enquanto
isso, na cabeça do herói americano, tudo que se passava eram planos para
destruir aqueles assassinos da moral e dos bons costumes ignorando agora por
completo sua semelhança em relação aos outros pontos daquela circunferência,
afinal, come seria ele semelhante em algo a aqueles comedores de criancinhas.
Porém
a vantagem de ser autor onipresente, é que posso dizer que o que se passava na cabeça do capitão,
era coincidentemente o mesmo que se passava pela cabeça de todos e é por isso,
e somente por isso, que de forma que parecia combinada, todos se levantaram ao
mesmo tempo, assumindo a mesma postura. E é por isso e somente por isso, que ao
mesmo tempo, se materializou no corpo de todos, a famosa roupa apertada com
aquela luva muito estranha, envolta pelo escudo com a listra no meio. E é por
isso, e somente por isso que todos saíram de encontro um ao outro gritando “Pela
América!”, até se chocarem no centro do círculo. E é por isso, e somente por
isso, que desse encontro só sobrou um cogumelo gigante que se dissipou em
poucos minutos.
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